quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Da paixão e outras cóleras

            Meu pensamento voa, quando você é o sujeito. Não consigo desviar da paisagem desse meu sonho tão improvável de realização de ter você ao meu lado (um dia tive). Tem razão, não deve mais existir. Afinal, trato de paixão e aquela de verdade, a maior de todas, deve ser vivida só uma vez na vida. Para ser especial mesmo, para durar pra sempre em nossos mais soturnos desejos de um reencontro. Paixão, a maior de todas, que supera a curta, a severa e a não muito empolgante, é só uma mesmo.
             Saiba caro leitor, que perder nem sempre representa perder. Às vezes, deixamos de fazer algo maravilhoso, como dar continuidade ao relacionamento de nossos sonhos, por nossas pernas fraquejarem diante da plena felicidade. Somos tão pessimistas que quando a vida nos mostra a pessoa de puro encantamento e devoção, optamos por abandonar a ideia de sermos felizes: isso não pode dar certo, nós nos amamos muito, a chuva cai dourada por nossa janela na madruaga, tudo de fantástico acontece nos nossos dias. Melhor parar por aqui. E aquela paixão se eterniza em nossa memória, acabamos com tudo, estragamos tudo, porque não encaramos em nossa rotina muita paixão, muita vontade de beijar, de abraçar, um coração acelerado ao topar com a amada do outro lado da rua, filmes que remetem à pessoa, odores, músicas, culinária.  Quando tudo é sintonia e nos combinamos demais. Mas, tudo não passa de uma noite, de um forró, de uma viagem, de uma quinta na taverna, de um passeio na orla. Tudo não passa de um tudo de momentos inesquecíveis que se sustentam na memória para sempre. Para a gente parar, olhar para o céu de uma noite bem escura e suspirar: ai, 'onde estará  o meu amor. Será que vela como eu?'
            Isso pode ocorrer mesmo que você já esteja muito bem casado, ou noivo, ou com algum compromisso leviano. A paixão, aquela paixão pra vida toda, pode ser lembrada em ocasiões bem inusitadas. Como durante o passeio com cachorro, ao desembaraçar o cabelo da filha de oito anos, ao lavar o carro, ou durante o debate político para prefeito, ou fazendo amor com a mulher. Pior é lembrar da grande paixão da vida ao dizer EU TE AMO para a mulher que você insiste em dizer para você que é a mulher da sua vida, mas que não existe diálogo com ela(coadjuvante dessa sua vida inútil), a não ser na hora de decidir a roupa que deve seguir para lavar, o que tem para o almoço, quem vai levar os filhos para a escola, quem vai pagar a conta de luz este mês. E você ainda se expõe na festa de fim de ano da família com declarações de amor para a mulher que apenas lhe serve como doméstica ou terapeuta ocupacional de seus problemas existenciais causados pela ausência dessa paixão que, é claro, você camufla, revelando apenas conflitos no trabalho, contas a quitar no fim do mês, dores provocadas por entes queridos que se foram tão repentinamente. Não assume pra você. É fraco. Faz planos para enriquecer, ter mais poder, mas não sabe lidar com a paixão. Só vive de cóleras e acha que é mais do que suficiente uma vida regada a peixe e música gospel no fim da tarde de domingo. PENA. Pena mesmo é entender que o tempo vem passando, como uma sombra em nossas consciências que nos questiona. Mas  ignoramos as hesitações do coração. E a paixão, prezado leitor, a paixão, segue em primeiro plano dos nossos fascínios sublimados. Segue a esmo, como nós. Sem muita perspectiva de um dia ser sujeito na vida do sujeito e honrar a ideia de que felicidade existe. E mora no fundo de nossos corações. Escondida para que ninguém veja quem realmente amamos.

            Definitivamente, não casamos com nossa maior paixão. A maior paixão de nossas vidas está oprimida em algum jingle de Natal. E se você chorar no fim do ano, diante do mar, afinando promessas com Iemanjá, é só para pedir, sem que alguém veja, para que essa paixão, tão plantônica, não morra no pensamento, para que  permaneça viva nessa vida de mentira, dividida.

        
         Desencontros...


Para você, Homem!

Anita Nin, 25 de outubro de 2012

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